sexta-feira, 21 de julho de 2017

Como um "bom dia" vira "vai se foder!" em questão de minutos

Acordo. Dou bom dia, tomo o café, me arrumo pra sair. Primeira desilusão: já de calça, sinto vontade de cagar. Só faltava botar o tênis, mas ok, melhor do que se estivesse já calçado.
No banheiro, segunda desilusão: na posição clássica de quem caga de calça, com ela arriada junto à cueca embolada no final das canelas, olho para baixo e vejo algo que me machuca; a etiqueta da minha calça marrom (que todos falam que é verde), tem, além do tamanho - 46 -, escrito VRD - VERDE (assim mesmo, redundante, como se me provocasse). A confirmação do meu daltonismo não me choca, mas a minha calça marrom ser verde e oficializar o que todo mundo diz pra mim, é sacanagem.
Limpo a bunda e parto para o ponto de ônibus. Após a demora usual, vem dois 624; um vazio, na frente, e um lotado atrás. Na frente deles um 783. Tem um filho da puta no ponto, comigo. Se ele fizer sinal pro 783, provavelmente o 624 vazio passará por trás dele e terei que pegar o lotado. Sim, eu já sei o que aconteceu, mas narrarei no tempo futuro, cheio de "se", para manter você nessa tensão escrota de "ui, será que ele foi em pé ou sentado no ônibus?". O 783 faz a curva, seguido na cola pelo 624 vazio, um carro de passeio e o 624 cheio. O filho da puta que tá no ponto comigo se mexe, chega mais próximo do meio fio; se ele fizer sinal ao 783 vou tacar minha mochila na cabeça dele e ele ficará sem entender porra nenhuma. O 783 se aproxima, mas o cara do ponto não faz sinal a ele, foi alarme falso (provavelmente só está de saco cheio da espera); nem vou chamar mais de filho da puta. Faço sinal com dois dedos, com o braço mais pra cima do que pro lado, indicando pro 783 que não é ele (o primeiro da fila que eu quero), mas o segundo, o que vem atrás dele. O 783, subitamente, vem na minha direção, para parar no ponto. Desesperado e sem pensar, porque são sete da manhã e vai tomar no cu que isso não é horário nem prá estar acordando, que dirá pegando ônibus, e eu vejo o 624 vazio pegando o vácuo do 783 pela esquerda - ele vai passar direto!!! -, entro no meio da rua, na frente do 783, e no meio da pista, aceno como um louco para o motorista do ônibus pretendido. Ele fez como aquela garota metida que você era apaixonado na quinta série: olhou em frente, pro nada e te ignorou. Com o coração partido e em meio ao riso dos coleguinhas, digo, buzinadas do 783, volto para a calçada, humilhado, e o 783 parado. Atrás dele, o 624 lotadão. Decido que vou esperar mais, mas não entrarei nesse ônibus.
Eis que o motorista do 783 resolve abrir a porta e "você tá malu...", mas nem deixei completar a frase, porque no que a porta dianteira dele estava abrindo já me armei com "ah vai se foder! Tomar no cu, porra!" Ele me xingou, nem ouvi, joguei o braço direito pro alto várias vezes. Descontei a raiva que estava do motorista do 624 em cima do cara que freou o seu veículo pra não me atropelar. Só estou tendo essa reflexão agora, e tô envergonhado por ter xingado a ele, mas aconteceu.
Cruzei os braços e fiquei com a cara amarrada no ponto. O 624 lotado ainda estava parado atrás do 783; quando o 783 saiu, o 624 (já mencionei que estava lotado, certo?) andou lentamente, e o motorista parou na minha frente, abriu a porta e olhou pra mim, com pena, sem eu ter feito sinal.
Entrei nessa merda; puto, mas entrei.

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