quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Poesia crônica de Carnaval

Ônibus lotado. Uma fadinha ruiva, uma Mulher Maravilha (com pomo-de-adão), um Mario (aquele que fez você-sabe-o-quê-e-onde), e outras fantasias, todos gritando em coro e batendo no teto do busão: 
"Rema, rema, rema, remadô-or!
Vou botar no cu d..."
 Eis que surge o Vincent Vega confuso, carregando GIF na mão, e todos param de cantar, pois vêem que não há cobrador.
Uma menina com um humor duvidoso gritou, lá do fundo:
"Já que a gente já tá na pista..."
E a galera entendeu, e continuou batendo no teto e cantando:
"Vou botar no cu do motorista!
Se o motorista for viado..."
Nesse momento há um grito absurdo que faz silenciar depois de uns três segundos (até os retardatários perceberem que todos pararam de cantar), e olharam para a fonte do grito: um aparente mendigo, sentado, maltrapilho, com uma garrafa de plástico de vinho vagabundo na mão, olhava seriamente para a platéia que havia conseguido. Respirou fundo e com o olhar e a voz graves, falou:
"Bando de quizumbeiro do caralho, se vocês tão botando no cu de alguém, e o motorista for viado, por que vocês vão procurar a porra do delegado pra botar no cu? Pergunta se o motorista tá afim, buçanha frita! E para com essa merda de querer botar no cu de quem tá trabalhando... o motorista já tá sem cobrador, a empresa bota no cu dele todo dia, ônibus de merda pra ele dirigir, calor de suar saco e o cara de calça nesses ônibus sem ar condicionado... Ainda tem que agüentar um monte de gente batendo no ônibus e gritando que se ele for viado, vai botar no cu do delegado! Não fode! Vai todo mundo enfiar o remo no cu, cambada de escroto!"
E nesse momento as pessoas começaram a refletir. Uns chegaram à conclusão que o motorista podia ser viado, mas ativo, e não gostar de dar o cu, então botar no cu dele não seria certo; outros pensaram que é mesmo, se o motorista é viado, por que não botar no cu dele e todo mundo sai feliz, quem quer botar no cu do motorista e o motorista, que é viado; e teve quem pensou que o motorista poderia não ser viado, e aí sim faria sentido buscar o cu do delegado. Mas o negócio é que o silêncio foi instaurado naquele veículo, e as pessoas foram refletindo até descerem do ônibus. Alguns inclusive desistiram do carnaval depois disso.
E o mendigo ficou feliz que foi em silêncio para onde ia.

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